quinta-feira, 25 de outubro de 2012

O ESTOUROU DA ‘BOLHA’


“NÃO SEI SE O TUMULTO DA COMERCIALIZAÇÃO ESTARIA CONTURBANDO ALGUMA COISA: PARECE QUE HÁ MUITOS TÍTULOS DE GIR E ESTÁ SOBRANDO ANIMAIS POR AÍ”.  Royalties a doutor Evaristo Soares de Paula. Anais do Simpósio Especial sobre a Raça Gir, 1989.

O posicionamento exclusivo e diferenciado ao GIR fez nascer uma marca poderosa e de absoluta confiança: GIR LEITEIRO. Uma ‘trustmark’. Imprimiu um conceito ‘brand’ indicando uma funcionalidade à raça significando sinal de qualidade e fator de diferenciação. Isto acabou por gerar uma relação de cumplicidade com seus consumidores ao oferecer satisfação e compensação no refletir do que ‘gosto’ e do que ‘preciso’. Ao incorporá-la culturalmente, o consumidor/criador projetou em sua personalidade o que é ser criador de GIR LEITEIRO: prazer, status, poder, etc.. A expressão passou a funcionar holisticamente autoafirmando sua identidade: ‘sou criador de GIR LEITEIRO’. O integrou em sociedade definindo, consciente e inconscientemente, suas atitudes: o que ‘quero’ e o que faço’. O ‘feedback’ de relações /experiências positivas com a expressão e melhores preços no mercado geraram uma cumplicidade tornando o consumidor/criador num advogado da causa. Crenças e valores ficaram confirmados e comprovados ao agregarem valores ao próprio consumidor estabelecendo um sentimento de gratificação e, consequentemente, de autoestima. Enche o peito para dizer: ‘sou criador de GIR LEITEIRO’. A cultura criada em torno da expressão GIR LEITEIRO projetou uma única aptidão selecionável e aceitável à raça, o leite. O GIR LEITEIRO passou a ser o legítimo representante da raça zebuína no Brasil. A palavra PADRÃO até então usada para diferenciar o importado (com chifres) da variedade mocha (sem chifres) criada no Brasil, passou a designar indivíduos que não recebiam o rótulo de GIR LEITEIRO, porém, enquadrados no ‘padrão racial’ exigido pelo SRG/ABCZ. Foi inclusive uma necessidade diante de tamanhas concessões do serviço cartorial ao GIR LEITEIRO no tocante ao padrão racial. Era como se houvessem duas raças Gir: ‘padrão’ e ‘leiteiro’. Há uma suspeição por parte dos ‘puristas’ de que o GIR LEITEIRO originou-se fora da consonância entre puros de origens, e sim, através de cruzamentos absorventes utilizando-se do LA (Livro aberto), onde após a segunda geração com paternidade PO (puro de origem) recebe a categoria PO. Fala-se, inclusive, em ingerência de outras raças na sua composição. Mas isso é assunto para outro texto. Marca poderosa e de confiança do mercado; cúmplice de seus consumidores; incorporada culturalmente à personalidade de seu criador/consumidor, autoafirmando sua identidade; integrando-o em sociedade através de crenças e valores externados num sentimento de gratificação e autoestima, não pode mais parar. Nunca! Gir é leite, leite, leite, leite, infinitamente, leite. O escritor João Ubaldo Ribeiro, num programa de entrevista dizia ‘que o Universo não é contra nem a favor, ele existe!’. O mesmo dia em relação ao Mercado. Não é contra, nem a favor. Ele existe. É indiferente. Porém, cobra caro pelo erro. Esse erro existiu? Sim! Ao invés de uma pressão seletiva para a produção de leite, objetivou-se a produção de lactações para dar sustentação ao ‘marketing’ da marca. Todo criador de GIR LEITEIRO tornou-se um selecionador tendo como objetivo de seu trabalho a comercialização de genética, seja através de sêmen, embriões ou animais vivos. E, para isso, o ‘status quo’ haveria de ser mantido. Os que saíram à frente foram seguidos de perto pelos que vinham atrás. A produtividade (quantidade de produção) de uma vaca Gir num curral foi substituída pela potencialidade de lactação nos Controles e Torneios Leiteiros. Resultado: a ‘bolha’ estourou.

“O PASSADO CONSOLIDOU POSIÇÕES DE PUREZA RACIAL, O FUTURO NOS RESERVA A EFICIÊNCIA RACIAL” [...] “É IMPOSSÍVEL UM PAÍS TROPICAL COMO O NOSSO PRETENDER TER UM MILHÃO DE SELECIONADORES DE SEMENTES ZEBUÍNAS PURAS”. Royalties ao doutor João Gilberto Rodrigues da Cunha. Anais do Simpósio Especial da Raça Gir, 1989.

Luiz Humberto Carrião.
Outubro/2012