domingo, 13 de maio de 2012

GIR, o equívoco da Fênix




Certa feita um professor de marketing apresentou a disciplina com a seguinte frase: ‘o primeiro negócio de qualquer negócio é continuar no negócio. Para tanto, é preciso gerar e manter consumidores’. Existe um equívoco entre o papel exercido pelo marketing e aquele exercido pela publicidade e propaganda que também se diferenciam. A propaganda dissemina idéias, informações e conhecimentos através da publicidade (ato de tornar público) e o marketing é o negócio visto sob o ponto de vista do cliente; é compreender o consumidor para que o produto se venda sozinho.

Anais do Simpósio Especial Sobre a Raça Gir, 1989, Mário Luiz Martinez (CNPGL): ‘Peço licença para explicar o Programa Nacional de Melhoramento do Gir Leiteiro [...] Esse é o teste para descobrir animais melhoradores [...] Já tentamos introduzir o programa na ABCZ, em 1976, mas não conseguimos. Em 1983, a ABCGIL aprovou a idéia’.

“Esse é o teste para descobrir animais melhoradores’, estava aí o referencial para gerar e manter consumidores de uma pecuária de elite na raça GIR, indistintamente, uma vez que foi tentada sua introdução na ABCZ, associação delegada pelo Ministério para o registro genealógico das raças zebuínas, dentre elas, a GIR, em 1976, sem sucesso. “Em 1983, a ABCGIL aprovou a ideia”. Trata-se de história tomando como fonte um documento oficial de uma associação promotora da raça, ASSOGIR. O PNMGL é a ferramenta para garantir a continuidade no negócio GIR. Garantia de um processo continuado.

O posicionamento exclusivo e diferenciado dado à raça através de uma funcionalidade exclusiva, o leite, sedimentou na expressão GIR LEITEIRO uma ‘marca de confiança’. Gerou uma relação de cumplicidade com seus consumidores tomando como ponto de partida a propaganda disseminada de lactações, valor genético e PTA (capacidade prevista de transmissão) de seus animais.

O impacto desse marketing, publicidade e propaganda sobre a raça teve um ‘efeito fênix’ - a fez renascer das próprias cinzas –. Muito mais pelos resultados econômicos alcançados, do que por opção de criação em si mesma. Isto fez com que muitos redirecionassem seus trabalhos, novos criadores aparecessem, e por último os investidores. Estes, muito mais preocupados com a rentabilidade do negócio enquanto aplicação do que atividade de produção. Os compêndios de Economia ensinam que: ‘o preço das coisas varia na razão direta da procura e na razão inversa da oferta. Quanto mais desejado for um bem – procurado – e quanto menos existir no comércio, tanto mais seu preço aumentará e vice-versa’. Com a democratização de animais melhoradores multiplicaram-se os produtores de genética no país, e com eles, a oferta de animais melhorados provocou a necessidade de repaginar marketing, publicidade e propaganda. Foi aí, que apareceram as ‘altas lactações’ como referencial de informação na propaganda do ‘gir leiteiro’. Sobre elas assevera Ivan Ledic: ‘alguns produzem leite, outros produzem lactações’.

A realidade produzida é que animais melhorados estão na vitrine do mercado como melhoradores; lactações produzidas como produção. Eis a questão!

Luiz Humberto Carrião

sábado, 12 de maio de 2012

GIR, marca ou raça?


Tenho preferências ao zebuíno de chifres. É o diferencial. E, por conseguinte, não o vejo como um detalhe apenas. Faz parte do todo. Aqueles que assim pensam, exige desse item uma estética a acompanhar sua preferência dentro do padrão racial. Um adendo para dizer que essa diversidade propiciada pelo GIR é que o torna tão interessante, apaixonante e polêmico. Vou mais longe! É uma raça que vai além da simples orientação funcional trazendo, em concomitância, a alma artística daquele que o cria. Que diferença faz se a perfeição é buscada (anatomicamente) na cabeça ou no úbere? Ou não existe preocupação daqueles que o exploram na funcionalidade leiteira com beleza, anatomia e funcionalidade do úbere? O importante é que ‘nenhum trabalho vale pelo resultado que produz, mas pela disposição de espontânea alegria e amor com que é feito’ [royalties a Huberto Rohden]. O resultado do trabalho, sob a ótica financeira, é uma conseqüência de si mesmo.

Por outro lado, vejo a produção do mestiço ½ sangue (gir x holandês) oriundo de uma matriz gir mocha mais prazerosa e produtiva. Por isso devo ter meu trabalho condenado? Mas condenado por quem? Com qual autoridade? Na produção dessa matriz gir mocha posso utilizar-me de touros PROVADOS cuja anatomia de cabeça não me agrada. A raça me dá essa opção. Não posso admitir que a carga genética de um animal seja levada a efeito pelos chifres. A questão de não utilizar determinados touros cuja cabeça não me agrada é uma questão de estética. Pura e simplesmente!

Outro detalhe que me tem chamado a atenção é a produção de carne em referência a Cota Hilton, que deve seu nome à cadeia de Hotéis homônima. É constituída de cortes especiais do quarto traseiro de ‘novilhos precoce’ (expressão usada para definir o animal abatido mais jovem com três a quatro dentes definitivos, 30 a 36 meses) alcançando internacionalmente de 3 a 4 vezes o preço da carne comum. Esclarecimento: o Brasil não se encontra entre os credenciados à produção: Austrália, Nova Zelândia, Argentina, Estados Unidos, Canadá e Uruguai. Mas a qualidade desse corte serve de referência a qualquer outro país. O cruzamento da raça Nelore x Red Angus tem alcançado um abate em torno de 18 a 20 meses, com 18 @, através do uso de creeping feeding durante o período do aleitamento materno e pasto suplementado pós-desmama. O que dizer com relação ao cruzamento Gir x Red Angus levando-se em consideração a habilidade maternal da vaca GIR e a produção de carnes nobres (posterior)? Boiadas estão sendo abatidas hoje nos frigoríficos em torno de 16 @ arrobas para machos e 14 para fêmeas, peso este que será alcançado (estimativa) por este cruzamento aos 18 meses. É só fazer a conta tomando como referência 100 matrizes GIR distribuídas em duas estações de monta em grupo de 50 cada e projetar o resultado final.

O que existe são mitos de interesses de poucos em detrimento de um todo. Desmitificar, essa é a palavra de ordem. Criadores de mito não os perdem facilmente, e nem podem. ‘Um produto pode vender devido ao apelo lógico que exerce sobre a nossa mente consciente, mas uma marca – ao contrário de um produto individual – forma-se emocionalmente com o passar do tempo e entra no nosso inconsciente numa maré de emoções e não por meios lógicos... ’ [royalties a William Backer]. Não podemos esquecer que ‘gir leiteiro’ é uma marca. Uma realidade produzida. Sobre marca (realidade produzida) Sal Randazzo afirma: ‘Dentro desse espaço perceptual da marca podemos criar sedutores mundos e personagens míticos que, graças à publicidade, ficam associados ao produto’. No que foi dada a funcionalidade específica leiteira a GIR, criando a expressão ‘gir leiteiro’, nada mais fizeram do que projetar uma marca no mercado, cuja sustentabilidade tem sido levada a efeito através de ‘altas lactações’ e um biótipo a diferenciá-lo do até então existe, que de certa forma está sendo desmontado pela Ciência e lactações aferidas em matrizes padrão utilizando-se das mesmas ferramentas. Apesar da extraordinária aceitação pelo mercado, a marca ‘gir leiteiro’, ao que parece, por falta de outros mitos de sustentação vai se exaurindo. Aos poucos a GIR vai deixando de ser uma marca para voltar à condição de raça.

Luiz Humberto Carrião