Nos diz Humberto de Campos: "... lembro-me de velha e valorosa árvore que conheci em minha primeira infância. Verde e forte, assemelhava-se a uma catedral na obra prodigiosa da Natureza. Cheia de ninhos, era o palácio das aves canoras que, em suas frondes, trinavam felizes. Tropeiros exaustos encontravam à sua sombra, que protegia cristalina fonte, o reconforto e a paz, o repouso e o abrigo. Lenhadores, de quando em quando, frutavam-lhe pedaços vivos e peregrinos ingratos roubavam-lhe ramos preciosos para utilidades diversas. Tempestades terríveis caíam sobre ela, anualmente, oprimindo-a e dilacerando-a, mas parecia refazer-se, sempre mais bela. Coriscos alcançaram-na em muitas ocasiões, mas a árvore robusta ressurgia, sublime. Ventanias furiosas, periodicamente, inclinavam-lhe a copa, decepando-lhe galhos vigorosos; a canícula demorada impunha-lhe pavorosa sede e a enxurrada costumava rodeá-la de pesados detritos... O tronco, porém, sempre adornado de milhares e milhares de folhas seivosas, parecia inabalável e invencível. Um dia, contudo, alguns bichinhos começaram a penetrá-la de modo imperceptível. Ninguém lhes conferia qualquer significação. Microscópicos, incolores, quase intangíveis, que mal poderiam fazer ao gigante do solo? Viajores e servos do campo não lhe identificaram a presença. Mas os bichinhos multiplicaram-se, indefinidade, invadiram as raízes e ganharam o coração da árvore vigorosa, devorando-o, pouco a pouco ... E o vegetal que superara as ameaças do céu e as tentações da Terra, em reduzido tempo, triste e emurchecido, transformava-se em lenho seco, destinado ao fogo."
Como essa valorosa árvore poderemos nos tornar "em lenho seco" se não acautelarmos contra os vermes da inveja e do ciúme, sempre dispostos a comandar o ser humano em sua mais estúpida bestialidade, revolvendo-o aos seus instintos mais primitivos. Como ser humano opte pelo caminho das águas que, "como um fio na serra encanta mais do que o mar".
Luiz Humberto Carrião
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